O
pai de Francisco queria que ele comparecesse perante o bispo para renunciar a
todos os seus direitos de herdeiro, e que lhe restituísse o que ainda possuía.
Como verdadeiro amante da pobreza, Francisco prestou-se de boa vontade à
cerimônia, apresentou-se no tribunal do bispo e, sem esperar um momento nem
hesitar sobre fosse o que fosse, sem esperar por uma ordem nem pedir qualquer
explicação, despiu todas as suas roupas e entregou-as a seu pai. [...] A seguir,
cheio de fervor e levado pela embriaguez espiritual, descalçou os sapatos e,
completamente nu perante a assistência, declarou a seu pai: «Até agora
chamei-te pai na Terra; doravante poderei dizer com segurança: "Pai Nosso
que estais no Céu", pois foi a Ele que confiei o meu tesouro e entreguei a
minha fé».
O bispo, homem santo e
muito digno, chorava de admiração ao ver os excessos a que o levava o seu amor
a Deus; levantou-se, tomou o jovem nos braços, cobriu-o com o seu manto e
mandou buscar alguma coisa para lhe vestir. Trouxeram-lhe um pobre manto de
burel de um camponês que estava ao serviço do bispo. Francisco recebeu-o com
gratidão e, apanhando em seguida do chão um pedaço de giz, traçou nele uma
cruz: a veste significava este homem crucificado, este pobre meio despido. Foi
assim que o servidor do Grande Rei ficou nu para caminhar atrás do seu Senhor,
pregado à cruz na sua nudez.
São Boaventura
(1221-1274), franciscano, doutor da Igreja
(A Vida de São Francisco, Legenda major, cap. 2)
(A Vida de São Francisco, Legenda major, cap. 2)
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