quarta-feira, 29 de junho de 2016

Rezar um Salmo (115): "Como agradecerei ao Senhor tudo quanto Ele me deu?"

Confiei no Senhor, mesmo quando disse: 
         «Sou um homem infeliz». 
Na minha perturbação exclamei: 
         «É falsa toda a segurança dos homens». 

Como agradecerei ao Senhor 
tudo quanto Ele me deu? 
           Elevarei o cálice da salvação, 
           invocando o nome do Senhor. 

Cumprirei as minhas promessas ao Senhor na presença de todo o povo. 
           É preciosa aos olhos do Senhor 
           a morte dos seus fiéis. 

Cumprirei as minhas promessas ao Senhor na presença de todo o povo, 
           nos átrios da casa do Senhor, 
           dentro dos teus muros, Jerusalém.

Entrar no espírito do salmo
Este salmo é a oração de um doente que, chegando à conclusão que “é falsa toda a segurança nos homens”, faz a sua profissão de plena confiança em Deus.
“Estamos a caminho da cidade da alegria. Na peregrinação terrestre, estamos abatidos; lá, a nossa felicidade será sem mistura. Cidade dum povo em festa: aos lamentos do desejo sucede a alegria da posse” (Santo Agostinho).

Como vivê-lo
Viver agradecido é tomar consciência, antes de mais, que dependo de outro… que nada sou só! Tornar cada tarefa, cada missão como uma resposta gratuita ao que a própria vida me pede e me dá. Dar é consequência do pedido. Dar e receber, andam de mão dadas… Agradecer é acolher, é oferecer. Só nesta medida se cumpre as promessas a Deus: construir a felicidade a somos chamados. 

Oração
Deus de bondade, Tu que em cada momento assumes a nossa humanidade, comprometendo-Te na totalidade connosco, dando a vida por amor, faz-nos capazes de nos comprometermos conTigo na pessoa de cada irmão. Torna-nos agradecidos e generosos. Por Jesus Cristo, Teu Filho, que é Deus conTigo na unidade do Espírito Santo. Ámen. 

(retirado do site da Diocese de Portalegre - Castelo Branco) 


terça-feira, 28 de junho de 2016

A Oração conjuga-se no presente!

Teresinha do Menino Jesus rezava enquanto fazia limpezas, varrendo o claustro do Carmelo de Lisieux. «É lá que que eu rezo melhor», confia ela aos seus cadernos! E também me acontece a mim rezar enquanto arrumo o meu apartamento, enquanto cozinho... Santa Tereseinha é formidável: esta rapariguinha, que morreu aos vinte e quatro anos, recebeu tudo de Deus com uma simplicidade e uma inspiração incríveis. Então, porque não acreditar nela? É possível rezar de imediato, não importa em que circunstâncias. A oração conjuga-se no presente! Santa Teresinha não pára de repetir: «Para amar, só tenho hoje.» É preciso viver o presente, onde nós estamos, e tudo pode acontecer, pois Deus está lá. É inútil procurar noutro sítio! 
Eu rezo a toda a hora, mas também gosto do silêncio que abre à contemplação. No silêncio a escuta torna-se mais atenta às intenções de Deus. Como Maria, que «conservava todas as coisas, ponderando-as no seu coração», diz-nos o evangelista Lucas. Ela é um modelo de presença silenciosa, amante, maternal. 
(Michael Lonsdale - "O Amor tem um rosto" - Um grande ator fala de Jesus) 

domingo, 26 de junho de 2016

Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova… Tarde Te amei! (Sto. Agostinho)

1. Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova… Tarde Te amei!

Trinta anos estive longe de Deus. Mas, durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração… Eu era inquieto, alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava… Mas Tu Te compadeceste de mim e tudo mudou, porque Tu me deixaste conhecer-Te. Entrei no meu íntimo sob a Tua Guia e consegui, porque Tu Te fizeste meu auxílio.

2. Tu estavas dentro de mim e eu fora… 
“Os homens saem para fazer passeios, a fim de admirar o alto dos montes, o ruído incessante dos mares, o belo e ininterrupto curso dos rios, os majestosos movimentos dos astros. E, no entanto, passam ao largo de si mesmos. Não se arriscam na aventura de um passeio interior”. Durante os anos de minha juventude, pus meu coração em coisas exteriores que só faziam me afastar cada vez mais d’Aquele a Quem meu coração, sem saber, desejava… Eis que estavas dentro e eu fora! Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Estavas comigo e não eu Contigo…

3. Mas Tu me chamaste, clamaste por mim e Teu grito rompeu a minha surdez… “Fizeste-me entrar em mim mesmo… Para não olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido. Mas Tu me arrancaste do meu esconderijo e me puseste diante de mim mesmo, a fim de que eu enxergasse o indigno que era, o quão deformado, manchado e sujo eu estava”. Em meio à luta, recorri a meu grande amigo Alípio e lhe disse: “Os ignorantes nos arrebatam o céu e nós, com toda a nossa ciência, nos debatemos em nossa carne”. Assim me encontrava, chorando desconsolado, enquanto perguntava a mim mesmo quando deixaria de dizer “Amanhã, amanhã”… Foi então que escutei uma voz que vinha da casa vizinha… Uma voz que dizia: “Pega e lê. Pega e lê!”.

4. Brilhaste, resplandeceste sobre mim e afugentaste a minha cegueira. Então corri à Bíblia, abri-a e li o primeiro capítulo sobre o qual caiu o meu olhar. Pertencia à carta de São Paulo aos Romanos e dizia assim:“Não em orgias e bebedeiras, nem na devassidão e libertinagem, nem nas rixas e ciúmes. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo” (Rm 13,13s). Aquelas Palavras ressoaram dentro de mim. Pareciam escritas por uma pessoa que me conhecia, que sabia da minha vida.

5. Exalaste Teu Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus… de Quem separar-se é morrer, de Quem aproximar-se é ressuscitar, com Quem habitar é viver. Deus… de Quem fugir é cair, a Quem voltar é levantar-se, em Quem apoiar-se é estar seguro. Deus… a Quem esquecer é perecer, a Quem buscar é renascer, a Quem conhecer é possuir. Foi assim que descobri a Deus e me dei conta de que, no fundo, era a Ele, mesmo sem saber, a Quem buscava ardentemente o meu coração.

6. Provei-Te, e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me, e agora ardo por Tua Paz. “Deus começa a habitar em ti quando tu começas a amá-Lo”. Vi dentro de mim a Luz Imutável, Forte e Brilhante! Quem conhece a Verdade conhece esta Luz. Ó Eterna Verdade! Verdadeira Caridade! Tu és o meu Deus! Por Ti suspiro dia e noite desde que Te conheci. E mostraste-me então Quem eras. E irradiaste sobre mim a Tua Força dando-me o Teu Amor!

7. E agora, Senhor, só amo a Ti! Só sigo a Ti! Só busco a Ti! Só ardo por Ti!…

8. Tarde te amei! Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu Te amei! Eis que estavas dentro, e eu, fora – e fora Te buscava, e me lançava, disforme e nada belo, perante a beleza de tudo e de todos que criaste. Estavas comigo, e eu não estava Contigo… Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Chamaste, clamaste por mim e rompeste a minha surdez. Brilhaste, resplandeceste, e a Tua Luz afugentou minha cegueira. Exalaste o Teu Perfume e, respirando-o, suspirei por Ti, Te desejei. Eu Te provei, Te saboreei e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me e agora ardo em desejos por Tua Paz!

Santo Agostinho, Confissões 10, 27-29

sábado, 25 de junho de 2016

Mesmo que a tua fé seja frágil, o Espírito Santo permanece sempre contigo!

Um coração simples não tem a pretensão de compreender sozinho tudo o que há para saber sobre a fé. Diz de si para si: «Há quem compreenda melhor aquilo que não percebo bem, ajudando-me a seguir o caminho.» Vivemos num tempo em que muitos se perguntam: «O que é a fé?» 
A fé é uma confiança muito simples em Deus, um estímulo de confiança indispensável, continuamente retomado ao longo da nossa vida. 
Pode haver dúvidas em cada um de nós. Não há nada de inquietante nisso. 
Gostaríamos sobretudo de escutar Cristo que murmura no mais profundo de nós:«Tens hesitações? Não te preocupes. Mesmo que a tua fé seja frágil, o Espírito Santo permanece sempre contigo.»
Há quem tenha feito esta descoberta surpreendente: o amor de Deus também pode desabrochar numa alma assaltada por dúvidas. 
A nossa oração pessoal é também muito simples. Achamos que para rezar são necessárias muitas palavras? Não. Pode acontecer que poucas palavras, por vezes desajeitadas sejam suficientes para entregarmos tudo a Deus, tanto os nossos medos como as nossas esperanças. 
Ao entregarmo-nos ao Espírito Santo, encontramos o caminho que nos leva da inquietação à confiança e dizemos-lhe: 

«Espírito Santo, 
faz-nos voltar para ti a cada instante. 
Esquecemo-nos tantas vezes que habitas em nós, 
rezas em nós e amas em nós. 
A tua presença em nós 
é confiança e contínuo perdão.» 


A oração não nos afasta dos problemas do mundo. Pelo contrário, não há nada que seja mais responsável do que rezar: quanto mais vivermos em oração humilde, mais seremos levados a amar e a expressar esse amor com a nossa vida. 

(Irmão Roger de Taizé)

  

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Tornai-nos dignos, Senhor, de servir os nossos irmãos...

Senhor, quando eu tiver fome, 
dai-me alguém que precise de comida!

Quando tiver sede,
dai-me alguém que precise de água.

Quando sentir frio,
dai-me alguém que precise de ser aquecido.

Quando estiver ferido,
dai-me alguém a consolar.

Quando a minha cruz se tornar pesada,
dai-me a cruz do outro a partilhar.

Quando me achar pobre,
Conduzi-me a alguém necessitado.

Quando não tiver tempo,
dai-me alguém que possa ajudar por um instante.

Quando sofrer uma humilhação, 
dai-me ocasião para elogiar alguém

Quando estiver desencorajada, 
dai-me alguém para lhe dar novo ânimo.

Quando sentir necessidade da compreensão dos outros,
dai-me alguém que precise da minha.

Quando sentir necessidade de que cuidem de mim,
dai-me alguém que eu tenha de atender.

Quando pensar em mim mesma,
voltai minha atenção para outra pessoa!

Tornai-nos dignos, Senhor, de servir os nossos irmãos
que vivem e morrem pobres e com fome, 
no mundo de hoje.

Dai-lhes, através de nossas mãos, o pão de cada dia,
e dai-lhes, graças ao nosso amor compassivo, a paz e a alegria.

(Madre Teresa de Calcutá)



domingo, 19 de junho de 2016

Deus ao dar-te a vida confiou-te uma missão!...

Talvez haja poucas coisas de maior transcendência do que a de compreender o sentido da vida. O sentido da supõe que a vida tem uma vocação, um chamamento, uma missão a cumprir, e a tua vida tem-na. Para a poderes realizar, deves conhecê-la e estudá-la profundamente.  
Que sentido pode ter a vida de quem, voluntariamente, ignora a sua vocação e a missão que lhe está designada? Essa missão, essa vocação, é estritamente pessoal e, portanto, cada um tem a sua, que é intransmissível: ninguém pode realizar a tua missão pessoal, se tu não a cumprires. A responsabilidade e a importância da missão que te compete radica no facto de que, quem ta confiou foi nada menos que o próprio Deus. Confiou-ta ao dar-te a vida, porque foi para isso que ta deu, para a realizares: Se não fizeres, frustras os planos de Deus, frustras a tua vida.
                                                        (Alfonso Milagro no livro "Os cinco minutos de Deus")

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Se Cristo, amanhã, bater à tua porta, reconhecê-Lo-ás?...

Será, como outrora, um homem pobre,
um homem só, certamente.
Será provavelmente um operário,
um desempregado, talvez,
ou mesmo, se a greve é justa, um grevista.
Ou, melhor ainda, será um angariador
de apólices de seguro, 
ou venderá aspiradores…

Subirá escadas e mais escadas,
deter-se-á, tempo infindo, nos patamares
com um sorriso maravilhoso
no seu rosto triste…
Mas a tua porta é tão sombria…

De resto, 
ninguém repara 
no sorriso das pessoas
que não quer receber
“Não estou interessado”,
dirás antes de o ouvires.

Ou então a tua criadita repetirá,
como um discurso decorado;
“A senhora tem os seus pobres”;
e fechará a porta
na cara do Pobre
que é o Salvador.  

Será talvez um refugiado,
um dos quinze milhões de refugiados
com o passaporte da ONU;
um daqueles que ninguém quer
e que vão errando,
errando neste deserto 
em que se tornou o mundo;
um daqueles que devem morrer
“porque, no fim de contas,
nem se sabe donde 
vêm as pessoas dessa laia…”
Ou melhor ainda, na América,
será um preto,
um negro, como eles dizem,
cansado de mendigar um lugar nas pensões
de Nova Iorque,
como outrora, em Belém,
a Virgem Nossa Senhora…

Se Cristo, amanhã, bater à tua porta reconhecê-Lo-ás?

Tem um ar acabrunhado,
extenuado,
oprimido como está
por ter de arcar com todas 
as penas do mundo…
Vamos lá!... Não se dá trabalho
a um homem tão cansado…

E depois, se se lhe pergunta:
“Que sabes fazer?”
não pode responder: “tudo”;
“Donde vens?”,
não pode responder: “de toda a parte”,
“O que queres ganhar?;
não pode responder: “a ti”.

E Ele partirá, então,
mais abatido, mais derrotado,
com a Paz nas suas mãos nuas…

(Raul Follereau)

Cristo bate hoje à tua porta, na pessoa de cada colega teu,
em todos aqueles que vais encontrar neste dia…
E tu? Vais deixá-Lo à porta?
Vais deixá-Lo triste e abatido porque O não quiseste ajudar? 

terça-feira, 14 de junho de 2016

Simplicidade de coração e de vida...

Uma das primeiras palavras de Cristo no Evangelho é: «Felizes os corações simples». 
Sim, feliz o que caminha rumo à simplicidade, tanto de coração como de vida. 
Um coração simples procura viver o momento presente, procura acolher cada dia como um hoje de Deus. 
Não será através da alegria serena e da boa disposição que transparece o espírito de simplicidade?
Simplificar a vida permite partilhar com os mais desfavorecidos, aliviando o sofrimento onde há doença, pobreza ou fome... 
Os irmãos e eu... tanto os que estão em Taizé como os que, noutros continentes, vivem entre os mais pobres - estamos bem cientes de sermos chamados a uma vida simples. Descobrimos que esta nunca nos impediu de praticar todos os dias a hospitalidade. 
(Irmão Roger de Taizé - no livro "Não pressentes a felicidade?")  

domingo, 12 de junho de 2016

Deus conhece-nos e recompensa todo o esforço sincero!

“Quem não puder fazer grandes coisas, faça ao menos o que estiver ao alcance de suas forças; certamente não ficará sem recompensa!”  (Santo António de Lisboa)
Deus conhece-nos e recompensa todo o esforço sincero. Corremos o risco de fracassar quando, desconhecendo os nossos limites, queremos fazer algo que está além de nosso alcance. Os atletas conseguem grandes marcas, só depois de muito treino. A prudência recomenda-nos começar a fazer o que está ao alcance de nossas “mãos”, com dedicação, e à medida que a prática nos dá segurança, estaremos a fazer mais e melhor. Com o tempo e sem perceber, estaremos a fazer grandes coisas. É como subir uma escada, os primeiros degraus são meio inseguros, mas à medida que subimos, os nossos passos são dados com mais confiança. Ninguém vai exigir algo além de sua capacidade, mas dê o melhor de si na medida das suas forças, sem preguiça, certamente a sua dedicação será recompensada. 
(José Irineu Neneve)

sábado, 11 de junho de 2016

Santo António de Lisboa, Doutor da Igreja

Todos os anos celebramos, chegado o mês de Junho, a Festa dos Santos Populares, dando especial enlevo a Santo António, São João e São Pedro.
Para o povo português, Santo António ocupa um lugar muito especial, porque um dos seus santos portugueses é conhecido e amado pelo mundo inteiro, pelo seu testemunho de vida e pelas graças que tem concedido a muitas pessoas. Já o papa Leão XIII o chamou de “o santo de todo o mundo”.
Santo António nasceu em Lisboa em 1191 ou 1192, sendo os seus pais Martinho de Bulhões e Teresa Taveira. Recebeu o Baptismo oito dias após o seu nascimento, sendo-lhe dado o nome de Fernando.
Aos 15 anos toma a decisão de entrar no Mosteiro de São Vicente de Fora, pertencente à Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho. Contudo, após 2 anos da sua entrada neste mosteiro pede transferência para o Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, para encontrar paz e recolhimento para viver a sua vocação.
No Mosteiro de Santa Cruz procurou aprofundar os seus estudos e valorizar a sua oração.
Em 1220 foi ordenado sacerdote.
Todavia, mais do que uma vez que Fernando sonhou na possibilidade de abraçar outro género de vida, mais longe do ruído do mundo.
A vida simples dos pobrezinhos, filhos de São Francisco de Assis, do ermitério de Santo António dos Olivais em Coimbra, atraiu-o irresistivelmente. Teve o seu primeiro contacto com esta comunidade de irmãos franciscanos, quando o seu mosteiro hospedou os cinco primeiros mártires franciscanos de Marrocos, quando estes passaram por Coimbra para partirem para África. Mais tarde, este Mosteiro receberia as relíquias destes cinco homens que na sua pobreza e testemunho de vida, morreram no anúncio da Boa-Nova.
Que impressão causaram em Fernando os despojos mortais daqueles cinco homens! Despertaram nele o desejo de consagrar-se ao apostolado e morrer mártir de Cristo.
É então que professa os votos nos franciscanos e Fernando muda o nome para António.
A imposição do hábito foi rápida e simples e no verão de 1120 já Santo António envergava a veste franciscana, desembarcando pouco tempo depois em Marrocos para iniciar a sua missão.
Uma terrível doença deteve-o todo o inverno na cama e os superiores da missão acharam melhor repatriá-lo para poder recuperar melhor. Com este intenção embarcou, mas um vento forte impeliu para o Oriente, obrigando-o a atracar nas costas da Sicília.
Não tardou a oportunidade de Santo António se revelar como um excelente pregador. Tal aconteceu num sermão que pregou em Setembro de 1221 diante de alguns religiosos franciscanos e dominicanos que se tinham acabado de ordenar.
O seu primeiro campo de acção apostólica foi a Romanha, região com grandes heresias.
Depois em Rimíni encontrou forte oposição nos hereges, que impediram o povo de assistir aos sermões. Então é aqui que acontece o célebre milagre de Santo António aos Peixes, onde o Santo vai á costa do Adriático e começa a pregar aos peixes que colocam a cabeça de fora da água e escutam atentamente o sermão.  Este milagre envergonhou os hereges e despertou grande entusiasmo na cidade.
Passados uns anos de apostolado eficaz é nomeado professor de teologia. São Francisco informado da sua sabedoria e santidade, pede-lhe que assuma a formação dos irmãos da ordem franciscana.
Pouco tempo durou este magistério, porque o crescimento da heresia albigense em França, reclama a sua presença para defender os valores cristãos.
No final de 1229, Deus envia-o a Pádua e lá é-lhe confiado a composição dos sermões para todas as festividades dos principais santos e para os domingos do ano. A solidão e o retiro do convento de Arcella, junto de Pádua, convidavam ao recolhimento e ao estudo necessários para escrever os seus sermões.
Ao chegar a Quaresma, suspendeu António o estudo para dedicar-se de novo à pregação. Era tão vivo o seu zelo devorar-lhe o coração, que se propôs a pregar durante os 40 dias da Quaresma, o que levou a cabo, apesar da hidropisia maligna que o afligia.
Consumido pelo esforço e pala doença, retirou-se Santo António à solidão de Arcella. Aí a doença, que o afligia, anunciou o fatal desenlace. Recebidos os sacramentos, cantou a Nossa Senhora, e sorriu para os que o rodeavam. Ao terminar de rezar os salmos entrou em êxtase e voltando a si fitou, uma última vez, aqueles que o rodeavam, entregando a sua alma a Deus. Era Sexta-feira, 13 de Junho de 1231. Logo que expirou, as crianças de Pádua correram a cidade gritando: “Morreu o Santo! Morreu Santo António!”
Tantos milagres aconteceram, logo após a sua morte, que nem passado um ano o papa Gregório IX canonizou-o. Pio XII em 1946 proclamou-o Doutor da Igreja, atribuindo-lhe o título de Doutor Evangélico.
Santo António não perdeu a actualidade e a sua memória e evocada pelo povo cristão, que vê nele o santo que ressuscita os mortos, que sara as enfermidades, que falou aos peixes, que converteu os hereges, que alivia os bolsos dos ricos em proveito dos pobres necessitados, que assegura e multiplica o as provisões, que suaviza os obstáculos que dificultam os matrimónios, que encontra coisas perdidas e que amigavelmente conversa com o Menino Jesus.
Santo António, é assim um exemplo para nós, porque apesar da sua sabedoria e dos seus dotes intelectuais, sempre assumiu a sua vida como uma entrega ao anúncio do Evangelho, mesmo através das pequenas coisas do dia-a-dia como varrer o convento, atender na hospedaria, ajudar os necessitados, entre outras coisas.
Que Santo António de Lisboa nos ajude e ensine a maneira de sermos grandes nas pequenas coisas do dia-a-dia e na atenção que devemos dar à voz de Deus que se revela através dos nossos irmãos. 

quinta-feira, 9 de junho de 2016

"Louvado sejas, meu Senhor, com todas as tuas criaturas" - S. Francisco de Assis

Todos nos encantamos com o famoso "Cântico das Criaturas", mas talvez nem todos saibamos que ele foi composto por Francisco de Assis num momento de grande sofrimento. Isso só faz aumentar mais o mérito de Francisco, mostrando-nos a sua grandeza de alma e a sua espiritualidade. Desafia-nos, também, a sermos alegres no Senhor, mesmo quando à nossa volta, tudo pareça dizer o contrário. 
Na época, Francisco já sofria de dores atrozes nos olhos, impedindo-o, quase, de dormir ou descansar. Sofria também do estômago, de uma úlcera gástrica; de ânsias de vómito, de um tumor ósseo, somado às dores oriundas dos Estigmas...
Nestas circunstâncias, ele teria tudo para alimentar autopiedade, para murmurar dia e noite, para cobrar uma intervenção divina, para afundar em depressão... Francisco, porém, encontrou ânimo, inspiração para escrever o seu mais belo poema ao Senhor: 
- Quero compor um novo louvor ao Senhor pelas suas criaturas, para minha consolação, e para a edificação do próximo. 
Assim era a alegria de Francisco. Mesmo atormentado pela dor, soube entoar louvores a Deus, porque a alegria de Francisco se situou além do sofrimento, da humilhação, da pobreza. Rejubilou-se no Senhor, porque só n´Ele encontrou conforto. Francisco nunca deixava que a dor e o desconforto fossem maiores do que o seu amor ao Criador. Encontrava forças para pensar na beleza de tudo o que Deus criara. Deixou transbordar o coração de poeta num ardoroso e apaixonado canto ao Criador, à luz, à alegria, à festa da vida, à harmonia do Universo... Ei-lo: 

Altíssimo, omnipotente, bom Senhor, 
Teus são o louvor, a glória, a honra 
e toda a bênção. 
Só a ti, Altíssimo, são devidos; 
E homem algum é digno 
de te mencionar. 

Louvado sejas, meu Senhor
Com todas as tuas criaturas.
Especialmente o senhor irmão Sol
Que clareia o dia
E com sua luz nos ilumina
E ele é belo e radiante,
Com grande esplendor:
De ti, Altíssimo, é a imagem.

Louvado sejas, meu Senhor
Pela irmã Lua e as Estrelas
Que no céu formastes claras
E preciosas e belas.

Louvado sejas, meu Senhor
Pelo irmão Vento.
Pelo ar, nublado
Ou sereno, e todo o tempo
Pelo qual às tuas criaturas dás sustento.


Louvado sejas, meu Senhor
Pela irmã Água
Que é muito útil e humilde
E preciosa e casta.

Louvado sejas, meu Senhor
Pelo irmão Fogo
Pelo qual iluminas a noite
E ele é belo e jovial
E vigoroso e forte.

Louvado sejas, meu Senhor
Por nossa irmã, a mãe Terra
Que nos sustenta e governa
E produz frutos diversos
E coloridas flores e ervas.

Louvado sejas, meu Senhor,
Pelos que perdoam por teu amor,
E suportam enfermidades e tribulações.
Bem aventurados os que sustentam a paz,
Que por ti, Altíssimo, serão coroados.
Louvado sejas, meu Senhor,
Por nossa irmã a Morte corporal,
Da qual homem algum pode escapar.
Ai dos que morrerem em pecado mortal!
Felizes os que ela achar
Conformes á tua santíssima vontade,
Porque a morte segunda não lhes fará mal!
Louvai e bendizei a meu Senhor,
E dai-lhe graças,
E servi-o com grande humildade. 
Como podemos perceber, o amor de Francisco por todas as criaturas não se baseia num romantismo ou sentimentalismo. É um amor profundo que nasce em Deus e o conduz até Deus. No esplendor do sol, existe a beleza de Deus; na água, existe a bondade de Deus; no fogo, existe a alegria de Deus e Jesus luz do mundo; na terra, existe a Providência de Deus; e na morte, Francisco reconhece e exalta a vida de Deus. 

(Frei Jorge E. Hartmann, OFM - "Francisco, o irmão sempre alegre")



terça-feira, 7 de junho de 2016

«A alegria e a bondade do coração.»

Um dia perguntei a um jovem qual era, a seu ver, o sustento essencial da sua vida. Ele respondeu: «A alegria e a bondade do coração.» 
A inquietação, o medo de sofrer, podem afastar a alegria. 
Quando surge em nós a alegria colhida do Evangelho, esta traz um sopro de vida. 
Não somos nós que criamos essa alegria. Ela é dom do Espírito Santo. É incessantemente renovada pelo olhar de confiança de Deus sobre as nossas vidas. 
Longe de ser ingénua, a bondade de coração supõe zelo, vigilância. Pode levar-nos a assumir riscos. E não dá qualquer espaço ao desprezo pelo outro. 
Torna-nos atentos aos mais desfavorecidos, aos que sofrem, à infelicidade das crianças. Ela sabe exprimir através do rosto, do tom de voz, que todos os seres humanos precisam de ser amados. 
Durante uma visita a Taizé, o filósofo Paul Ricoeur dizia: 
«A bondade é mais profunda que o mais profundo dos males. Por mais radical que seja o mal, ele nunca é tão profundo como a bondade.»
Sim, Deus permite-nos caminhar com uma centelha de bondade no fundo da alma, uma centelha que quer transformar-se numa labareda. 
A minha mãe é para mim um testemunho vivo da alegria e bondade do coração. Tinha aprendido em criança a ser benevolente com todos: na sua família, recusavam-se a denegrir a imagem dos outros com palavras que os ridicularizassem ou que formulassem juízos severos. 
Ela transmitia uma confiança total aos seus próprios filhos. Ao longo da vida, mesmo quando as provações nos fazem questionar a nós mesmos, nos fazem tomar consciência dos nossos limites, esse dom extraordinário permanece: «Podes ter confiança em ti». Era o que a minha mãe procurava transmitir a cada um dos seus nove filhos. 
Ela irradiava uma paz enorme e isso vinha-lhe das provações por que tinha passado. Quando confrontada com uma situação difícil, esperava alguns instantes para que a tranquilidade voltasse e, depois, mudava de assunto, como se nada tivesse acontecido. Nela não havia atitudes exaltadas, mas uma alegria profunda. Parecida conservar uma plenitude de paz. No entanto, disse-me algumas vezes: «Vocês pensam que, dentro de mim, há paz interior permanente, quando, na realidade, há uma luta profunda.»

(Irmão Roger de Taizé no livro "Não pressentes a felicidade?") 

domingo, 5 de junho de 2016

"Suave Milagre" - Eça de Queirós

"Ora entre Enganin e Cesareia, num casebre desgarrado, sumido na prega de um cerro, vivia a esse tempo uma viúva, mais desgraçada mulher que todas as mulheres de Israel. O seu filhinho único, todo aleijado, passara do magro peito a que ele o criara para os farrapos da enxerga apodrecida, onde jazera, sete anos passados, mirrando e gemendo. Também a ela a doença a engelhara dentro dos trapos nunca mudados, mais escura e torcida que uma cepa arrancada. E, sobre ambos, espessamente a miséria cresceu como bolor sobre cacos perdidos num ermo. Até na lâmpada de barro vermelho secara há muito o azeite. Dentro da arca pintada não restava um grão ou côdea. No Estio, sem pasto, a cabra morrera. Depois, no quinteiro, secara a figueira. Tão longe do povoado, nunca esmola de pão ou mel entrava o portal. E só ervas apanhadas nas fendas das rochas, cozidas sem sal, nutriam aquelas criaturas de Deus na Terra Escolhida, onde até às aves maléficas sobrava o sustento! Um dia um mendigo entrou no casebre, repartiu do seu farnel com a mãe amargurada, e um momento sentado na pedra da lareira, coçando as feridas das pernas, contou dessa grande esperança dos tristes, esse rabi que aparecera na Galileia, e de um pão no mesmo cesto fazia sete, e amava todas as criancinhas, e enxugava todos os prantos, e prometia aos pobres um grande e luminoso reino, de abundância maior que a corte de Salomão. A mulher escutava, com os olhos famintos. E esse doce rabi, esperança dos tristes,
onde se encontrava? O mendigo suspirou. Ah esse doce rabi! quantos o desejavam, que de desesperançavam! A sua fama andava por sobre toda a Judeia, como o sol que até por qualquer velho muro se estende e se goza; mas para enxergar a claridade do seu rosto, só aqueles ditosos que o seu desejo escolhia. Obed, tão rico, mandara os servos por toda a Galileia para que procurassem Jesus, o chamassem com promessas a Enganim; Sétimo, tão soberano, destacara os seus soldados até à costa do mar, para que buscassem Jesus, o conduzissem, por seu mando, a Cesareia. Errando, esmolando por tantas estradas, ele topara os servos de Obed, depois os legionários de Sétimo. E todos voltavam, como derrotados, com as sandálias rotas, sem ter descoberto em que mata ou cidade, em que toca ou palácio, se escondia Jesus. A tarde caía. O mendigo apanhou o seu bordão, desceu pelo duro trilho, entre a urze e a rocha. A mãe retomou o seu canto, a mãe mais vergada, mais abandonada.
E então o filhinho, num murmúrio mais débil que o roçar duma asa, pediu à mãe que lhe trouxesse esse rabi que amava as criancinhas, ainda as mais pobres, sarava os males, ainda os mais antigos. A mãe apertou a cabeça engelhada: - Oh filho! e como queres que te deixe, e me meta aos caminhos, à procura do rabi da Galileia? Obed é rico e tem servos, e debalde buscaram Jesus, por areais e colinas, desde Chorazim até ao país de Moab. Sétimo é forte e tem soldados, e debalde correram por Jesus, desde Hébron até ao mar! Como queres que te deixe? Jesus anda por muito longe e nossa dor mora connosco, dentro destas paredes e dentro delas nos prende. E mesmo que o encontrasse, como convenceria eu o rabi tão desejado, por quem ricos e fortes suspiram, a que descesse através das cidades até este ermo, para sarar um entrevadinho tão pobre, sobre enxerga tão rota? Acriança, com duas longas lágrimas na face magrinha, murmurou: - Oh mãe! Jesus ama todos os pequeninos. E eu ainda tão pequeno, e com um mal tão pesado, e que tanto queria sarar! 
E a mãe, em soluços: - Oh meu filho como te posso deixar! Longas são as estradas da Galileia, e curta a piedade dos homens. Tão rota, tão trôpega, tão triste, até os cães me ladrariam da porta dos casais. Ninguém atenderia o meu recado, e me apontaria a morada do doce rabi. Oh filho! Talvez Jesus morresse... Nem mesmo os ricos e os fortes o encontram. O Céu o trouxe, o Céu o levou. E com ele para sempre morreu a esperança dos tristes. De entre os negros trapos, erguendo as suas pobres mãozinhas que tremiam, a criança murmurou: - Mãe, eu queria ver Jesus... E logo, abrindo devagar a porta e sorrindo, Jesus disse à criança: - Aqui estou."